Geopolítica e Brasil Potência.
*Capítulo III da tese de mestrado de Samuel de Jesus intitulada: SIVAM: os militares e a Amazônia. Defendida em abril de 2003.
O professor Shiguenoli Miyamoto64 afirma que houve uma mudança na
concepção de segurança após a década de sessenta com a edição do Decreto-Lei n°
314 de 1967, ou Lei de Segurança Nacional. Essa lei deslocou o eixo das
discussões sobre o conceito de segurança. Ela possuía uma abrangência muito
grande e possibilitava, também, ao grupo hegemônico, detentor do controle do
aparelho do Estado, a oportunidade de realizar seus planos de elevação do país
ao status de potência. Segundo a Escola Superior de Guerra (ESG) essa condição
era justificável pelo fato de as elites civis serem despreparadas.
A garantia
da ordem para os militares era fundamental à implementação do lema segurança e desenvolvimento, com o
intuito de alcançar para o Brasil um determinado grau de desenvolvimento,
almejando a categoria de potência média. Para isso, era necessária a coesão
interna, mesmo que ela fosse alcançada pela a via autoritária, qualquer
possibilidade de conflito interno colocaria em risco esse intento.
...de um lado pela preparação no devido tempo e conveniente
adequação do instrumento integral da ação estratégica - o Poder Nacional -
mediante a elevação ou fortalecimento do potencial da nação e sua transformação
oportuna em poder efetivo, de outro lado, pela concepção e condução em tempo de
paz ou guerra, do conjunto de ações estratégicas visando tanto em âmbito
internacional e interno a superação dos antagonismos que se manifestem contra a
consecução quanto à salvaguarda daqueles
objetivos nacionais.66
Tais
afirmações estão presentes na Política de Defesa Nacional elaborada em 1996. Os
objetivos desta Política de Defesa visam a garantia,
a) a
soberania por meio da preservação da integridade territorial, do patrimônio e
dos interesses nacionais b) o Estado de Direito e as instituições democráticas;
c) a preservação da coesão e da unidade da Nação; d) a salvaguarda das pessoas,
dos bens e dos recursos brasileiros ou sob jurisdição brasileira; e) a consecução e a manutenção dos interesses
brasileiros no exterior; f) a projeção do Brasil no concerto das nações e sua
maior inserção no processo decisório internacional; e g) a contribuição para a
manutenção da paz e da segurança internacionais.67
A orientação estratégica da
Política de Defesa Nacional teria como base o escopo de atuação do Estado
brasileiro na área de defesa prover segurança à Nação, tanto em tempo de paz,
quanto em situação de conflito. Para tanto, a presente política é centrada em
uma ativa diplomacia voltada para a paz e em uma postura estratégica
dissuasória de caráter defensivo, baseada nas seguintes premissas:
·
Fronteiras
e limites perfeitamente definidos e reconhecidos internacionalmente;
·
Estreito
relacionamento com os países vizinhos e com a comunidade internacional, em
geral, baseado na confiança e no respeito mútuo,
·
Rejeição
à guerra de conquista;
·
Busca
da solução pacífica de controvérsias, com o uso da força somente como recurso
de autodefesa.
Para a consecução dos objetivos da
Política de Defesa Nacional as seguintes diretrizes deveriam ser consideradas: j) proteger a Amazônia brasileira, com o apoio
de toda a sociedade e com a valorização da presença militar; 1) priorizar ações
para desenvolver e vivificar a faixa de fronteira, em especial nas regiões
norte e centro-oeste; m) aprimorar a organização, o aparelhamento, o
adestramento e a articulação das Forças Armadas, assegurando-lhes as condições,
os meios orgânicos e os recursos humanos capacitados para o cumprimento da sua
destinação constitucional; n) aperfeiçoar a capacidade de comando, controle e
inteligência de todos os órgãos envolvidos na defesa nacional,
proporcionando-lhes condições que facilitem o processo decisório, na paz e em
situações de conflito; o) aprimorar o sistema de vigilância, controle e defesa
das fronteiras, das águas jurisdicionais, da plataforma continental e do espaço
aéreo brasileiros, bem como dos tráfegos marítimo e aéreo; p) garantir recursos
suficientes e contínuos que proporcionem condições eficazes de preparo das
Forças Armadas e demais órgãos envolvidos na defesa nacional; q) fortalecer os
sistemas nacionais de transporte, energia e comunicações.68
Analisando
os objetivos, estratégias e Diretrizes da Política de Defesa Nacional - tais
como preservação da coesão da unidade da
nação e a adoção de uma postura
estratégica dissuasória de caráter defensivo que vigora plenamente -
podemos perceber a persistência de antigos traços de uma concepção resistente,
mesmo no período pós-autoritarismo; pois, a questão da segurança não foi de
toda suprimida, o exemplo maior disso foi a divulgação do Projeto Calha Norte
(PCN), em 1986.
Elaborado
sigilosamente pela Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional, o PCN
ressuscitou o temor dos países vizinhos com a política do governo brasileiro de
dedicar suas atenções as fronteiras do norte.69Precede
o Projeto Calha Norte algumas ações de Governo que acenavam para um
desenvolvimento e segurança maiores da região amazônica, como exemplos a
construção das bases aéreas de Boa Vista e Porto Velho, a partir do ano de
1984; criação do 7° Comando Militar Aéreo de Manaus (7° COMAR); assim como o
reativamento do Comando Militar da Amazônia, em 1992.
Na
verdade, o que Myiamoto quer demonstrar é a mudança, ocorrida nos anos 90, da
frente sul de conflito – sintetizada pela rivalidade entre Brasil e Argentina -
para a região norte, mais especificamente a região amazônica; com novos focos
de combate, dentre eles: a presença da guerrilha colombiana ao longo das
fronteiras entre Brasil e Colômbia, idéia da criação de uma Nação Yanomami em
parte do território brasileiro, seguida da tese da internacionalização da
Amazônia. Diante disso, Brasília viu como necessária a proteção militar da
região por intermédio do PCN. O SIVAM viria logo em seguida, ainda sob a égide
da concepção de defesa e segurança; apesar de ser, inegavelmente, um projeto de
caráter civil, seus objetivos se confundem com os Objetivos Nacionais
Permanentes, descritos pela ESG.
Miyamoto, em seu texto
Política de Defesa Brasileira e a
Segurança Regional,70 escreve
que em todos os governos militares (1964 a 1985) o binômio defesa/segurança
permeou todos os níveis das políticas públicas, sendo isso fácil de ser
percebido na formulação das políticas interna, externa e militar.
Segundo o autor, problemas como os das
fronteiras sempre foram considerados sob esta ótica binária: cita a Operação
trinta horas que consistiria em uma intervenção brasileira no Uruguai, caso
Líber Seregni fosse vitorioso nas eleições uruguaias de 1971; e a intervenção
em assuntos bolivianos por meio da derrubada do Presidente Juan Carlos Torres e
ascensão de Hugo Banzer. Segundo ele, essas intervenções encontravam-se sob o
contexto da chamada “teoria do cerco” em que decisões desse tipo eram levadas
adiante por um grupo pequeno, denominado “sistema”. Para este, todo país
vizinho que não tivesse um governo alinhado aos interesses nacionais, deveria
ser neutralizado.
Segundo
Miyamoto, nos anos 80 e 90, apesar de se pensar e falar que os militares
estavam longe do poder, sua influência ainda era considerável devido ao fato de
ter sido traçada neste período, uma política mais eficaz de proteção ambiental,
constituída na prática, em projetos como o projeto Calha Norte e o SIVAM. A
questão amazônica passou, desde os meados dos anos 80, a ser o alvo principal
da atuação brasileira no que concerne à segurança. Seguramente, a questão
ambiental foi uma das preocupações mundiais na década de 90, e, no Brasil, ela
foi considerada uma questão de segurança pelas Forças Armadas.
Geopolítica Ambiental
A questão ambiental é um assunto chave para o
século XXI, tendo em vista a escassez dos recursos naturais do planeta devido à
poluição ambiental acelerada, ao desflorestamento, à extração descontrolada dos
recursos naturais, etc. Segundo o primeiro Relatório
Nacional para a Convenção sobre a Biodiversidade Biológica, o Brasil é o
primeiro do mundo no que se refere à biodiversidade. A maior parte desses
recursos provém da Amazônia.
Martins Filho71,
considera uma questão fundamental a ser tratada, a problemática da água; a
escassez deste elemento, para ele, será a grande temática mundial das próximas
décadas – escreve o autor ter sido esta visão sintetizada pelo Comandante
Militar da Amazônia, general do Exército, Luiz Gonzaga Schroeder Lessa. Ele
afirma estarem os EUA na faixa amarela quanto a água potável, podendo já
encontrar problemas de escassez no ano de 2025. Segundo ele, situação semelhante
pode ser encontrada no documento aprovado pelo National Foreign Intelligent Board, dos Estados Unidos redigido por
um grupo de especialistas civis, em que é enfatizada a discussão sobre a água.
Esse documento aponta que haverá aumento da possibilidade de conflitos pela
água a partir de 2015.
Assim,
serão valiosos os recursos hídricos. Dentro desse quadro, a Amazônia
constitui-se na maior bacia de água doce do planeta, representando assim 1/5 do
total da reserva de água doce, ou seja, responsável por aproximadamente 20% do
desaguamento global dos rios.
Segundo Washington Novaes,72
um dos principais ambientalistas brasileiros, dispomos hoje de apenas 0,00378%
da água do planeta (o restante está nos oceanos, nas geleiras, em aqüíferos
ainda inacessíveis). Existem previsões de guerras pela água na África, no
Oriente Médio, na Ásia. Embora o Brasil tenha uns 20% de toda água doce do
planeta, 60% das internações hospitalares decorrem de doenças vinculadas a
água.
Em
se falando de recursos naturais, outro ponto a ser destacado é a energia
natural altamente limpa e renovável que, brevemente, substituirá os recursos
energéticos extraídos de fósseis como o petróleo, óleo diesel, Ainda a floresta
possibilitaria a construção de usinas a gás natural na região de Urucum,
situada na calha do rio Juruá, tendo esta sua potencialidade estimada pela
Petrobrás em 55 bilhões de m³. A região possui uma grande quantidade de gás
natural, alternativa limpa. O Brasil possui um potencial de 65% de fontes
renováveis de energia, enquanto os Estados Unidos dependem 75% dos combustíveis
fósseis.
A
Amazônia possui 18 espécies oleaginosas nativas; seu potencial energético
comprovadamente substitui o óleo diesel com eficácia maior e sem danos ao meio
ambiente, sobretudo com a vantagem de ser renovável. A França há tempos,
investe recursos na oleaginosa de dendê (Elaeis
guineensis) visando à substituição do óleo diesel.
Partindo
dos recursos naturais, para a variedade do eco-sistema amazônico - a região
esta mundialmente conhecida pela variedade do seu ecossistema – percebemos que
esta correspondendo a 1/3 das reservas tropicais do mundo, estendendo-se por
7.300.000 Km², dos quais 68,2% estão concentrados em território brasileiro. Ali
também se encontra o maior número de espécies de plantas por hectare de
floresta, se compararmos ao continente norte americano; nas florestas
temperadas da França são encontrados apenas 50 tipos de árvores enquanto que na
Amazônia brasileira podemos encontrar mais de 2.500 espécies. Assim:
Pela
sua riqueza diversificada, a região amazônica torna-se um campo percorrido por
legiões de homens da ciência, mas também por industriais e governantes
nacionais e internacionais. A intensidade mineradora, agropecuária, madeireira
e da prática da biopirataria genética revela um dado perverso dos interessados
na Amazônia que caminha de braço dado com a simpatia da causa ecológica
protecionista73
A biodiversidade sendo reconhecida como uma
fonte riquíssima atrairá aquilo que chamamos de biopirata. A biopirataria é a
grande responsável pela exploração desmedida. Esta atividade ilegal rende
bilhões de dólares às indústrias químicas e farmacêuticas devido à extração dos
princípios ativos que transformados em ingredientes ativos. O líder indígena,
Airton Krenak, compara os biopiratas àqueles do século XVI e XVII e vai mais
além:
Da mesma maneira como os piratas desciam do Caribe, para saquear a
costa nos séculos XVI e XVII, os piratas modernos continuam saqueando a
América. Só que agora eles não estão saqueando com trabuco, eles estão
saqueando com computadores, satélites (...) No lugar de piratas truculentos,
eles estão botando executivos, presidentes democratas, parlamentares vacinados.
Tudo isto é uma orquestra montada para que o fluxo de sangria da América Latina
continue vivo, enquanto tiver um grama de minério, algum rio correndo ou alguma
floresta em pé, haverá um doido inventando ou justificando, programas que
chamam de desenvolvimento.74
Dentre alguns dos produtos extraídos da flora
amazônica, destacamos as plantas produtoras de látex. A seringueira,
responsável pelo desenvolvimento da região, tal como escrevemos no primeiro
capítulo, também plantas produtoras de óleo e gorduras como as palmeiras, a
castanha do Pará, Jatobá, Copaíba, onde se extraí resinas para a fabricação de
vernizes e aromáticas, importantes na elaboração de cosméticos. Além destas,
existem plantas medicinais como a graviola, empregada no tratamento do diabetes
e a copaíba, usada contra infecções.
No
ano passado foi divulgado que (...) o óleo de copaíba, extraído de uma espécie
vegetal da Amazônia, com alto poder antibiótico e anti-inflamatório, estaria
sendo pesquisado por uma indústria farmacêutica alemã, que poderia resultar em
um produto antibiótico inovador. Este seria mais um exemplo de recurso natural
encontrado em um país do terceiro mundo, cujo princípio uma vez detectado,
serviria para a criação de um produto, rendendo royalties aos seus
descobridores estrangeiros75
Tomando como referência o meio ambiente e a
manutenção das fronteiras, a percepção militar muda ao longo das três últimas
décadas em relação à região. Considerando o que escreveu Martins Filho, pode-se
ver que na década de 70, que as preocupações com relação à Amazônia consistiam
na tese da “Amazônia pulmão do mundo”, sendo substituído na década de 80 pela
problemática do “efeito estufa” e na década de 90 pela tese da “cobiça
externa”.
A
problemática do efeito estufa partia do princípio que as florestas exerceriam a
função de filtro, essencial no controle deste efeito. A idéia da “Amazônia
pulmão do mundo” era de que a Amazônia exerceria a função de manter estável o
clima nos países do hemisfério norte, pois ela era tal como uma máquina de
calor.
Martins
Filho76 afirma para quem conhece um pouco dos
debates sobre a geopolítica e estratégia amazônica tem condições de afirmar que
os militares brasileiros entram no século XXI mais convencidos de que a ameaça
de intervenção estrangeira por parte das potencias mundiais é o eixo da
problemática da defesa da Amazônia e alguns acontecimentos reforçaram esta
ótica tais como o Plano Colômbia.
A criação do SIVAM segue o mesmo sentido do
Projeto Calha Norte seria, segundo os militares, uma tentativa do Governo
brasileiro em redirecionar sua atenções para a Amazônia com a intenção de fazer
frente às pressões internacionais que preconizam a internacionalização desta
região.
Geopolítica do Narcotráfico.
No início de 1990, a preocupação do mundo já
não era mais a possibilidade da “catástrofe nuclear” ocasionado por um
confronto direto entre o leste socialista e o oeste capitalista, mas a questão
ecológica e ambiental passa a ganhar relevo, o mundo volta o seu olhar para a
Amazônia.
O combate
ao NARCOTRÁFICO passa a ser uma questão de estratégia para os EUA que, assim,
teriam em mãos uma justificativa plausível para a manutenção de sua intervenção
em países como, por exemplo, aqueles localizados na região central e sul do
hemisfério.
O re-direcionamento
da estratégia de ação norte-americana para o combate ao NARCOTRÁFICO foi
estimulado pelas Cúpulas de Cartagena e San Antônio. A cúpula de Cartagena
(Colômbia), de 1990, reuniu o presidente Bush (EUA), Paz Zamora (Bolívia), Alan
Garcia (Peru), Virgílio Barco (Colômbia). O principal resultado foi um acordo
de dez páginas, segundo o qual “a
cooperação econômica e as iniciativas internacionais, só, serão eficazes se
forem acompanhadas de programas enérgicos contra a produção e o tráfico e o
consumo de drogas ilegais.” Esses programas devem contar com organismos
policiais, fiscais e jurídicos e envolver várias instituições, uma ação com
aspecto amplo e não somente militar.77
A Cúpula de San
Antônio foi realizada na cidade de San Antônio (EUA), nos dias 26 e 27 de
fevereiro de 1992, com a presença dos presidentes Bush (EUA), Cézar Gavíria
(Colômbia), Alberto Fujimori (Peru), Paz Zamora (Bolívia), Rodrigo Borja
(Equador), Carlos Salinas (México), Carlos Andrés Peres (Venezuela). A Declaração de San Antonio estabeleceu que
o combate ao NARCOTRÁFICO deve respeitar em qualquer hipótese a soberania dos
países envolvidos (...). O combate ao narcotráfico deve ser feito de forma
compartilhada e que para uma ação mais efetiva é necessário oferecer estímulos
aos países que geram empregos e divisas.
Esse esforço
norte-americano de combate ao narcotráfico resultou em 1995, no Plano Colômbia.
Este documento feito pelo Departamento de Estado dos EUA prevê, não apenas
ajuda financeira, mas a presença de funcionários civis e militares
norte-americanos no território colombiano, país que está assentado sobre a
bacia amazônica. A justificativa para o Plano é o combate ao NARCOTERRORISMO,
supostamente promovido pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia
(FARC) e pelo Exército de Libertação Nacional
(ELN). A partir dessa presença ativa dos EUA na Colômbia, sua extensão para toda
a América do Sul é bastante provável. Segundo o jornalista Humberto Trezzi,78 os EUA já fizeram boa parte da América
do sul em seu campo de caça ao narcotráfico.
A presença norte-americana na América do sul é
considerável: há um total de 17 guarnições terrestres de radar; destas, três
estão no Peru, quatro na Colômbia, dez restantes são móveis e estão em lugares
secretos, mas segundo informações,79
duas dessas bases móveis estão no Caribe colombiano. Essas bases móveis contam
com pista de pouso para aviões de transporte e efetivo de 45 militares,
divididos em técnicos e guardas encarregados.
Orçamento do Plano Colômbia por função:
Militares
US$ 519 milhões 60%
Policiais US$ 123
milhões 14%
Alternativas
de desenvolvimento
US$ 68 milhões 8%
Ajuda a
refugiados
US$ 37 milhões 4%
Incremento
dos direitos humanos US$ 51 milhões 6%
Reforma
do judiciário US$ 13
milhões 2%
As verbas norte-americanas destinadas ao treinamento e
combate às drogas na região estavam assim divididas em 2000:
Colômbia - US$ 50 milhões.
Bolívia - US$ 48 milhões.
Peru - US$ 48 milhões.
Equador - US$ 1.2 milhão
Brasil - US$ 1.5 milhão.
Pensamos que esses fatores somados mostram
porque existe uma questão amazônica, tema de intensos debates no âmbito da
política internacional, e que essa questão vem sendo utilizada pelas Forças
Armadas como argumento-tese para a ocupação da região por meio de projetos de
desenvolvimento, nos quais os militares são os principais coordenadores,
legitimados por terem acompanhado o desenvolvimento da região, estando
treinados para quaisquer problemas, desde os anos 50.
O
exemplo do projeto SIVAM mostra-nos não só a dinamização da Aeronáutica em
buscar financiamento externo para a execução de um projeto de desenvolvimento
da região amazônica, mas também a atividade dos militares que se dá de uma
forma direta nos aspectos referentes à coordenação e, indiretamente, em sua
ação diferenciada ao procurar executar seus objetivos de segurança; ou seja,
tem–se acoplado o monitoramento às ações de desenvolvimento regional na área de
saúde e educação ou aos convênios feitos com universidades, instituições de
pesquisa, saúde e tecnologias.
Assim, seguindo as
teses geopolíticas, teses estas que também evoluem e tomam como constituinte de
si mesma a questão ambiental, os militares brasileiros são eficientes em notar
a importância da Amazônia e do seu desenvolvimento, mantendo-se como atores
privilegiados na ação de preservação da área sob controle do Brasil. Como foi
discutido aqui, também não parece ser fora de propósito a tese segundo a qual
os EUA tem grande interesse no controle da região. O investimento ligado à
questão da droga feito pelo governo norte americano na região, bem como a sua
presença quase soberana na Colômbia, atestam haver uma política norte-americana
com vistas ao controle da região amazônica tornando necessário que os governos
da região assumam sua soberania e coordenem ações para garanti-la. O SIVAM foi
apresentado ao país como sendo um projeto com essa finalidade; dado,
entretanto, o tipo de controle exercido pelos técnicos norte-americanos sobre o
processamento de dados coletados pelos satélites do SIVAM. Sabemos que esse
sistema não será útil para a finalidade pretendida.
Considerações finais.
O presente texto teve como objetivo a investigação sobre a
relação, Forças Armadas brasileiras e região amazônica por intermédio do estudo
do Sistema de Vigilância da Amazônia (SIVAM).
Vista da totalidade, a militarização da Questão
Amazônica remete à forte presença das Forças Armadas na vida nacional, pelo
fato da sociedade civil não ocupar, até agora, o espaço de atuação reservado a
ela; ao admitirmos que a força é inerente ao Estado, devemos também entender
que a decisão sob sua aplicação deve ser compartilhada. Uma vez considerada
medida importante pela sociedade, a ação rápida e efetiva para a Amazônia,
assim como a decisão sobre um Projeto da envergadura do SIVAM, estas deveriam
envolver todos os setores sociais, e não ficar restrito somente aos organismos
militares.
Como vimos, o SIVAM, dentro de uma concepção
geopolítica e geoestratégica obedece ao direcionamento da política de defesa
nacional quanto à manutenção das fronteiras e o controle do espaço aéreo para a
garantia da soberania nacional. O SIVAM, na visão das Forças Armadas, viria como
resposta à argumentação de internacionalização da Amazônia, uma vez que os
organismos internacionais (bancos, governos e ONG’s) afirmam não possuir o
Brasil política governamental efetiva para essa região, ao combate do
desflorestamento, garimpo ilegal e narcotráfico.
Em resumo, os militares de forma acentuada, a partir dos anos 50, viram
a Amazônia como uma região que deveria ser povoada e desenvolvida. Assim,
visando assegurar a soberania nacional. Desde então teria sido elaborados e
executados projetos para a área, tais como o Radar da Amazônia (RADAM), de
1970; o Tratado de Cooperação Amazônica, de 1976; etc. Em 1985, os militares, ao saírem do governo, continuaram voltados para
projetos de defesa e segurança do território brasileiro, sustentando a necessidade
de uma ação mais enérgica e realmente efetiva para a Amazônia.
Dessa forma, impuseram a
aprovação e implementação de sistemas de segurança e desenvolvimento amazônico
como o projeto Calha Norte, de 1985, e o SIVAM - sancionado em 1993, tinha como
meta para 2002, ao final de sua instalação, cobrir toda a região amazônica.
As teses do general Golbery do Couto e Silva e Carlos de Meira Mattos têm como inspiração a Política de Defesa Nacional no âmbito da política externa; suas teses procuram traçar todo quadro geopolítico do Brasil e da Amazônia, procurando demonstrar o destino reservado ao País, só podendo este ser alcançado por meio da segurança e desenvolvimento. Assim esses militares compreendem o SIVAM como um passo importante para assegurar aquela região ao país.
Ao desvendarmos os vários aspectos da relação dos militares com a Amazônia oferecemos conhecimento e uma análise sobre a atuação dos militares no Brasil hoje; isto nos ajudou a compreender os aspectos políticos que envolveram o Projeto SIVAM, e as articulações que ocorrem em seu entorno, possibilitando uma compreensão mais ampla, um entendimento maior a respeito do seu conteúdo e da continuidade da autonomia militar sob governos civis. Em outras palavras, procuramos mostrar, por meio do SIVAM, que a Amazônia, hoje, constitui-se a fundamental preocupação estratégica do Brasil, funcionando como a verdadeira missão para as FFAA, projeto de sua modernização e também de sua autonomia no governo civil.
As teses do general Golbery do Couto e Silva e Carlos de Meira Mattos têm como inspiração a Política de Defesa Nacional no âmbito da política externa; suas teses procuram traçar todo quadro geopolítico do Brasil e da Amazônia, procurando demonstrar o destino reservado ao País, só podendo este ser alcançado por meio da segurança e desenvolvimento. Assim esses militares compreendem o SIVAM como um passo importante para assegurar aquela região ao país.
Ao desvendarmos os vários aspectos da relação dos militares com a Amazônia oferecemos conhecimento e uma análise sobre a atuação dos militares no Brasil hoje; isto nos ajudou a compreender os aspectos políticos que envolveram o Projeto SIVAM, e as articulações que ocorrem em seu entorno, possibilitando uma compreensão mais ampla, um entendimento maior a respeito do seu conteúdo e da continuidade da autonomia militar sob governos civis. Em outras palavras, procuramos mostrar, por meio do SIVAM, que a Amazônia, hoje, constitui-se a fundamental preocupação estratégica do Brasil, funcionando como a verdadeira missão para as FFAA, projeto de sua modernização e também de sua autonomia no governo civil.
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p 257.
66 Ibidem. p. 251.
68 Ibidem.
item 5.0 Sub-ítem; 5.3. j, l, m,
o, p, q.
69 MIYAMOTO, Shiguenoli..
Op. Cit. p. 135.
70
Idem. A Política de Defesa Brasileira e a segurança regional. Campinas, SP,
IFCH 07/2001 COL. Primeira Versão.
71 MARTINS FILHO, João Roberto. Op. Cit.
72 NOVAES,
Washington. Eco 92: avanços e interrogações In: Revista de Estudos Avançados USP n°15. vol. 06, São Paulo:
1992, p.79.
73 Ibdem.
74 ROCHA,
Geroncio Albuquerque. Ai de ti Amazônia. In: Revista de Estudos Avançados USP; N°15. São Paulo: p.69.
75 REGO, Patrícia de Amorim.
Biodiversidade e justiça In: Revista do
Centro de Estudos Judiciários - CEJ. Brasília, n.8, mai/ago. p.23-39, 1999.
76 MARTINS FILHO, João Roberto. Op. Cit.
77 ARBEX JÚNIOR, José. Narcotráfico: um jogo de poder nas Américas
- São Paulo: Moderna,
1993 (Coleção polêmica).
78 TREZZI.
Humberto. “EUA já tem 20 guarnições na América do sul” In Jornal “Zero Hora”: Porto Alegre, 25/03/01.
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