O que é Estado ?
Por Samuel de Jesus
Estado não é um
conceito universal, mas serve para descrever uma forma de ordenamento político
surgido na Europa a partir do século XIII até o fim do século XVIII e XIX.
Bobbio adota o modelo histórico critico para analisar o Estado Moderno. Conceitualmente
Bobbio considera o Estado como um conceito homogêneo, o Estado Europeu é uma
forma de organização do poder historicamente determinada, mas diversa em relação a outras formas também determinadas e interiormente homogêneas, de organização do
poder. (BOBBIO, 1998, p. 427)
A primeira conformação Estatal é o Estado
Absolutista que teve na figura de Thomas Hobbes, o seu grande representante
teórico. Em Hobbes, o Estado soberano significava a realização máxima de uma
sociedade civilizada e racional. Segundo Hobbes, o egoísmo, a ambição e a
crueldade, próprios de cada um geraria uma luta sem fim, criando grandes
entraves à vida em sociedade, sobretudo, levando-a a destruição. Somente uma
instituição como o Estado, um poder acima das individualidades, garantiria
segurança a todos, assim a acumulação de poder através da soberania estatal
deveriam ser permanentes para evitar os instintos rompessem o equilíbrio
necessário ao estabelecimento da consciência racional. (TOMAZI, 1993, p. 126.)
Do mesmo modo que tantas outras coisas, a natureza (a arte mediante a
qual deus fez e governa o mundo) é imitada pela arte dos homens também nisto:
que lhe é possível fazer um animal artificial. Pois vendo que a vida não é mais
que um movimento dos membros, cujo início ocorre em alguma parte principal
interna, porque não poderíamos dizer que todos os autômatos (...) possuem uma
vida artificial? Pois o que é o coração senão uma mola; e os nervos senão
outras tantas cordas e juntas, senão outras tantas rodas, imprimindo movimento ao corpo
inteiro, tal como foi projetado pelo artífice? E a arte vai mais longe ainda
imitando aquela criatura racional, a mais excelente obra da natureza, o Homem. Por que pela arte é criado o
grande Leviatã a que se chama Estado, ou cidade (em latim civitas),
que não é senão um homem artificial, embora de maior estatura e força do que o
homem natural cuja defesa e proteção foi projetado. E no qual a soberania é uma
alma artificial, pois da vida e movimento ao corpo inteiro; os magistrados e
outros funcionários judiciais ou
executivos, juntas artificiais: a recompensa e o castigo (pelos quais todos
ligados ao trono da soberania, todas juntas e membros são levados a cumprir o
seu dever) são os nervos que fazem o mesmo no corpo natural; a riqueza e
prosperidade de todos os membros individuais são a força; ; salus populi ( a
segurança do povo) é seu objetivo; os conselheiros, através dos quais as coisas
que necessita saber lhe são sugeridas, são a memória; a justiça e as leis, uma
razão e uma visão artificiais, a concordia
e a saúde; a sedição e a doença; e a
guerra civil é a morte.Por último os pactos e convenções mediante as quais a
parte do corpo político foram criadas, reunidas e unificadas assemelham-se ao
Fiat, ao façamos o homem proferido por Deus na criação. (HOBBES, 1983, p. 05)
O Estado absolutista não afastou a igreja da cena
política, submeteu-a a seu poderio e conservou a sua função religiosa, até
mesmo porque foi através dos preceitos religiosos que o Estado Absolutista
legitimou sua dominação, por exemplo, a teoria do direito divino dos reis que fora dado por Deus. Essa teoria foi
elaborada pelo bispo francês Jacques Bossuet (1627-1704), segundo ela o monarca
é o representante de Deus na Terra e sua autoridade é, portanto sagrada,
embora devesse obedecer aos mandamentos de Deus e não podendo subverter a moral
e a política. (TOMAZI, 1993, p. 126.)
O cargo de soberano (seja ele um monarca ou uma
Assembleia) consiste no objetivo para o qual lhe foi confiado o soberano poder,
nomeadamente a obtenção da segurança do povo, ao qual está obrigado pela lei de
natureza e do qual tem de prestar contas a Deus, o autor dessa lei, e a mais
ninguém além dele. (HOBBES, 1983, p. 200)
A separação entre o monarca e o poder político do
Estado refletem as contradições do Absolutismo. Por um lado, por exemplo, os
atos dos monarcas se assemelhavam com Luis XIV que afirmou “O Estado sou eu” e ao
mesmo tempo os mesmos monarcas absolutistas adotaram medidas políticas e
econômicas em nome do interesse geral. Este é o ponto inicial para o
estabelecimento do interesse público e privado. (TOMAZI, 1993, p. 126.)
E porque, se os direitos essenciais da soberania forem
retirados, o Estado assim fica dissolvido, e todo o homem volta à condição e
calamidade de uma guerra contra os outros homens (que é o maior mal que pode
acontecer na vida), compete ao cargo de soberano manter esses direitos em sua
integridade, e consequentemente é contra o seu dever, em primeiro lugar,
transferir para o outro ou tirar de si qualquer deles. Pois aquele que
desampara os meios desampara os fins, e desampara os meios aqueles que sendo o
soberano reconhece estar sujeito ás leis civis e renuncia o poder da
judiciatura suprema, ou o poder de fazer a paz e a guerra por sua própria
autoridade, ou de julgar as necessidades do Estado, ou de levantar impostos e
soldados, quando e tanto quanto segundo sua própria consciência lhe parecer
necessário, ou de nomear funcionários e ministros quer da guerra quer da paz,
ou de nomear professores e examinar que doutrinas estão conformes ou contrárias
a defesa e paz e bem do povo. (HOBBES, 1983, p. 200)
Diferentemente do Estado Hobbesiano, o Estado em
Rousseau surge da necessidade de uma livre associação política entre as pessoas
pertencentes a uma comunidade. Esse Estado democrático é a encarnação da
vontade do povo.
Encontrar uma forma de associação que defenda e
proteja a pessoa e os bens de cada associado com toda a força comum, pela qual
cada um, unindo-se a todos, só obedece, contudo a si mesmo, permanecendo assim
tão livre quanto antes. Esse o problema fundamental cuja solução o contrato
social oferece. (HOBBES, p. 32).
O Contrato Social de Rousseau levará a República
chamada na antiguidade de Cidade – Estado.
Imediatamente esse ato de associação produz, em lugar
de cada pessoa particular e de cada contratante, um corpo moral e coletivo,
composto de tantos membros quanto o são os votos da assembleia, e que, por esse
mesmo ato, ganha sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua vontade. Essa pessoa
pública, que se forma desse modo, pela união de todas as outras, tomavam
antigamente o nome da cidade e, hoje, o de República ou de corpo
político o qual é chamado por seus membros de Estado quando passivo,
soberano quando ativo, e potência como comparado a seus
semelhantes. Quando aos associados recebem eles, coletivamente, o nome de povo
e se chama, em particular, cidadãos, enquanto partícipes da autoridade
soberana, e súditos enquanto submetidos às leis do Estado. (p. 33, 34).
Rousseau e a Política
Internacional
Maria Vitória Benevides (www.hottopos.com/harvard1/rousseau.htm) afirma, em seu texto Guerra e Paz em Rousseau –
Sobre o projeto da paz perpétua, que em Rousseau a guerra não seria
inerente à natureza do homem, mas resultado da vida em sociedade provocada pela
competição, o que levaria ao conflito.
A criação de um Estado,
portanto, não reduzirá as tensões ou a violência beligerante: um Estado forte
ameaçará a paz pela compulsão da conquista, um fraco tornar-se-á tentação para
a cobiça alheia... (Stanley
Hoffmann - "Rousseau, la guerre et la paix", in Rousseau et la
Philosophie Politique, vários autores, Paris: PUF, pp. 206-08.)
Dessa forma o equilíbrio não será automático, mas complexo
e dependente de muito esforço, pois a interdependência econômica que garantiria
a paz, na verdade gerará tensões. Para Rousseau a vontade universal não deve
desconsiderar a dimensão dos poderes, a desigualdade de poderes entre os
Estados. Os tratados e as alianças aprofundariam essas desigualdades e não o
contrário. (BENEVIDES In www.hottopos.com/harvard1/rousseau.htm).
Invoco Rousseau em Discurso sobre a origem e os
fundamentos da desigualdade entre os homens para reforçar o argumento de
Maria Victória Benevides.
Concebo, na espécie
humana, dois tipos de desigualdade: uma que chamo natural ou física, por ser
estabelecida pela natureza e que consiste na diferença das idades, da saúde,
das forças do corpo e das qualidades do espírito e da alma; a outra, que se
pode chamar de desigualdade moral ou política, por que depende de uma espécie
de convenção e que é estabelecida ou, pelo menos, autorizada pelo consentimento
dos homens. Esta consiste no vários privilégios de que gozam alguns em prejuízo
de outros, como o serem mais ricos, mais poderosos e homenageados do que estes,
ou ainda por fazerem-se obedecer por eles.
(ROUSSEAU, 1983)
Além do mais o Estado não é um ser natural com limites
próprios e definidos, mas um ente artificialmente construído que tem a
necessidade de se expandir e multiplicar os seus tentáculos, assim se tornaria
o temível monstro LEVIATÃ. Essa tendência geraria a rivalidade entre os Estados
que em nome da segurança e conservação aumentaria sem cessar, mas a custa
inclusive dos Estados vizinhos, diferentemente Rousseau recusaria a tese da
guerra de todos contra todos, pois não existiria a guerra entre os indivíduos,
mas entre Estados e de potência para potência. (BENEVIDES).
Para Kant a vida em sociedade seria a salvação do
homem e não a sua perdição seria sua condição para o progresso moral. Propõe a
criação de uma Liga Mundial, alicerçada em uma interdependência natural, tal
como um governo mundial alicerçado no comércio mundial, integração entre
mercados. Rousseau renegaria essa concepção considera a interdependência
econômica nefasta, uma fatalidade, pois a interdependência geraria dependência,
pois agravaria as tensões ao evidenciar as desigualdades naturais, físicas, morais
e políticas entre as nações. Para Rousseau tal governo sempre faria com que
prevalecesse as teses dos países mais fortes. (BENEVIDES In www.hottopos.com/harvard1/rousseau.htm).
O Estado
para John Locke durante o dia deveria guardar a sociedade para que ela adormeça
em paz e harmonia. Cabe ao Estado zelar pelo bem-estar e segurança interna e
externa de todos. Internamente cabe prover a segurança pública para garantir os
direitos inalienáveis contra qualquer subversão. (TOMAZI, 1993, p. 126.)
Assim, no estado de natureza, um homem adquire um
poder sobre o outro; mas não um poder absoluto ou arbitrário para tratar um
criminoso segundo as exaltações apaixonadas ou a extravagância ilimitada de sua
própria vontade quando está em seu poder; mas apenas para infringir-lhe, na
medida em que a tranquilidade e a consciência o exigem, a pena proporcional a
sua transgressão, que seja bastante para assegurar a reparação e a prevenção.
Pois estas são as únicas duas razões por que um homem pode legalmente ferir
outro, o que chamamos de punição. Ao transgredir a lei da natureza, o ofensor
declara estar vivendo sob outra lei diferente daquela da razão e equidade
comuns, que é à medida que Deus determinou para as ações dos homens, para sua
segurança mútua; e assim, tornando-se perigoso para a humanidade, ele
enfraqueceu e rompeu o elo que os protege do dano e da violência. Tratando-se
de uma violação dos direitos de toda a espécie, de sua paz e de sua segurança,
garantidas pela lei da natureza, todo homem pode reivindicar seu direito de
preservar a humanidade, punindo ou, se necessário, destruindo as coisas que lhe
são nocivas; dessa maneira, pode reprimir qualquer um que tenha transgredido
essa lei, fazendo com que se arrependa de tê-lo feito e o impedindo de
continuar a fazê-lo, e através de seu exemplo, evitando que outros cometam o
mesmo erro. E neste caso e por este motivo, todo homem tem o direito de punir o
transgressor e ser executor da lei da natureza. (LOCKE, 1983, p. ).
Bibliografia
BENEVIDES, Maria Victoria de M. Guerra e Paz em Rousseau - Sobre o Projeto da Paz Perpétua Disponivel em: www.hottopos.com/harvard1/rousseau.htm extraído em 11/06/2013.
BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de Política. Tradução de Carmen C. Varriale et al.,
coordenação de tradução de João Ferreira e revisão geral João Ferreira e Luis
Guerreiro Pinto Cacais. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1997.
HOBBES, Thomas. Leviatã. In: Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1974
LOCKE, J. Segundo Tratado sobre o governo. In: 3.ed. São. Paulo: Abril Cultural, 1983. Coleção Os Pensadores.
TOMAZI, N.D. (org). Iniciação à sociologia. São Paulo : Atual, 1993
Comentários
Postar um comentário