Ainda a Tutela Militar: os militares e a queda da presidenta Dilma Rousseff



 Escrito por Samuel de Jesus em 24.05.2016


"Então... Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranquilo, os caras dizem que vão garantir. Estão monitorando o MST, não sei o quê, para não perturbar".

Com esta fala, grampeada, o então Ministro do Planejamento Romero Jucá revelou que os Comandantes Militares estavam participando do processo político de impedimento da presidente afastada Dilma Rousseff. Este fato contraria tudo que a cúpula militar vinha dizendo publicamente nos últimos anos, ou seja, davam a entender que jamais interfeririam no processo político e afirmavam que víviamos em uma democracia.

Em 18 de março de 2016, o Comandante do Exército Brasileiro General Eduardo Villas Bôas afirmou: "Eu acho lamentável que, num país democrático como o Brasil, as pessoas só encontrem nas Forças Armadas uma possibilidade de solução da crise (...) Os três aspectos se interrelacionam e, em consequência, é uma crise para ser solucionada dentro desses ambientes, principalmente o ambiente político e jurídico (...) Não há paralelo com 1964, primeiro porque hoje nós não temos o fator ideológico. Naquela época, nós vivíamos a situação de Guerra Fria e a sociedade brasileira cometeu o erro de permitir que a linha de fratura da Guerra Fria [a] dividisse. Isso não existe mais. O segundo aspecto é que hoje o Brasil tem instituições sólidas e amadurecidas, com capacidade de encontrar os caminhos para a saída dessa crise (...) "Os três aspectos se interrelacionam e, em consequência, é uma crise para ser solucionada dentro desses ambientes, principalmente o ambiente político e jurídico". (Comandante do Exército: “É lamentável clamor por intervenção militar”. In: Brasil 427, 18.03.2016. Disponível em: http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/221764/Comandante-do-Ex%C3%A9rcito-%E2%80%9C%C3%89-lament%C3%A1vel-clamor-por-interven%C3%A7%C3%A3o-militar%E2%80%9D.htm)


Em artigo intitulado Apontamentos sobre o livro O Estado Militar na América Latina: as elites entre Allende e Dilma, este autor afirmou que:

"A previsão de vitória da presidente Dilma Rousseff em 2014 gerou tensões entre amplos setores da elite brasileira, principalmente a elite liberal obediente aos cânones do Consenso de Washington e o setor de comunicação que não consegue reproduzir seu poder (constituído em aparato midiático) em benesses e predomínio político e social. Esses setores alijados do poder geram tensões com o objetivo de criar fissuras institucionais que permitam compartilhamento ou até mesmo domínio da máquina dirigente. (...) O mais importante é a atenção em relação ao tamanho desses setores e sua capacidade de abrir brechas autoritárias definitivas e que poderão nos surpreender como em 1964." DISPONÍVEL EM: https://www.academia.edu/12310270/A_Atualidade_do_Livro_O_Estado_Militar_na_Am%C3%A9rica_Latina_de_Alain_Rouqui%C3%A9_o_bonapartismo_latino_americano?auto=download


 Este autor ao longo dos últimos 13 anos escreve sobre o ativo papel das Forças Armadas Brasileiras em vários aspectos da vida brasileira após 1985. É por este motivo que a fala de Romero Jucá sobre os militares não surpreende, pois eles possuem um papel, por exemplo, ativo na formulação das diretrizes estratégicas do país. Duas diretrizes mostram o poder das Forças Armadas Brasileiras. Destacamos a Estratégia Nacional de Defesa e o Livro Branco de Defesa Nacional. O primeiro documento versa sobre a conversão da Ciência e Tecnologia brasileira aos fins castrenses, devendo possuir uma aplicação militar. Em relação à LBDN destacamos a conversão da ação diplomática aos preceitos militares. Os militares se comportam como atores políticos ou como um partido fardado. 

Em 2013, em apresentação na comunicação baseada em meu artigo intitulado O Livro Branco de Defesa e suas Implicações Estratégicas http://www.mundorama.net/2013/06/01/o-livro-branco-de-defesa-do-brasil-e-suas-implicacoes-geopoliticas-por-samuel-de-jesus/  este pesquisador questionava no V Seminário do Núcleo de Pesquisas sobre o Pacífico e Amazônia, realizado em Araraquara e sob a coordenação do professor Enrique Amayo Zevallos, se o Ministério das Relações Exteriores do Brasil sofria um processo de militarização, pois preconizava o LBDN o trabalho conjunto entre MRE e MD? Considerava uma função incompatível com as tradições da diplomacia e desconfiava da militarização do Itamaraty. O questionamento era: os diplomatas estão se militarizando ou os os militares estão se civilinizando? Minha resposta era clara neste sentido. Os militares estão ativamente estendendo seus tentáculos ideológicos ao universo da política, naquele caso, à diplomacia. Ao final afirmava que os militares ainda exercem um relativo poder tutelar sobre a sociedade política.


o LBDN introduz um novo paradigma no campo da diplomacia e das relações internacionais ao afirmar que os ministérios da Defesa e das relações exteriores deverão agir conjuntamente no campo das Relações Internacionais, dessa forma aliena a diplomacia à área defesa. O aumento da importância do Ministério da Defesa em relação ao Ministério das Relações exteriores demonstra a introdução dos assuntos de defesa em um ministério que se pautaria por pressupostos como o diálogo e a diplomacia. Disponível em: http://www.mundorama.net/2013/06/01/o-livro-branco-de-defesa-do-brasil-e-suas-implicacoes-geopoliticas-por-samuel-de-jesus/

 Porém era também visível a presença dos militares em outras questões como a escolha dos aviões caça que sofreu tentativa dos setores castrenses em impedir a escolha dos caças franceses Dassault Raffale pelo presidente Lula. Ao final, a presidenta Dilma Rousseff escolheu os aviões suecos Gripen. Em relação à esta escolha a BBC de Londres informou que existia um relatório que foi divulgado ao público em que os militares brasileiros demonstravam sua preferência pelo avião caça sueco Gripenn NG em relação ao escolhido pelo presidente Lula o caça frances Rafale. A mencionada reportagem saiu com a seguinte afirmação: O vazamento de um relatório das Forças Armadas brasileiras recomendando a compra de caças suecos ameaça criar um atrito entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os militares, segundo afirmam alguns dos principais jornais franceses nesta quinta-feira. A reportagem da BBC Brasil segue mencionando a reportagem publicada em importante jornal brasileiro: Mas uma reportagem publicada na terça-feira pela Folha de São Paulo afirmava que um relatório da Aeronáutica enviado ao Ministério da Defesa apontava o caça Grippen NG, da empresa sueca Saab, como a melhor opção entre três concorrentes para a renovação da frota brasileira. (Disponível em: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2010/01/100107_imprensa_rafale_rw.shtml)

Estes episódios demonstram o papel político ativo das Forças Armadas não somente em espirito de corpo, mas com um papel garantidor da "ordem" aos conspiradores. Rompe-se, portanto a tese de que estariam subordinadas ao Comando em Chefe da presidenta da República Dilma Rousseff e, contrariamente ao seu papel constitucional, estavam em constante articulação com lideranças que promoveram um pacto institucional para a deposição da presidenta e que agora sabemos por Romero Jucá. Este pacto envolveu o Judiciário (Justiça Federal e STF), o Congresso Nacional, amplos setores da mídia, ONGs (OAB, FIESP) e agora sabemos os Comandos Militares

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